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A coragem de se desconectar
Menos notificações, mais travessia interior


Muita gente começa um hábito se perguntando:
“Será que vou conseguir manter isso todos os dias?”
Eu prefiro começar com outra pergunta: Qual é o resultado mínimo que me faz sentir em progresso, e qual é o mínimo abaixo do qual isso deixa de fazer sentido?
Esse pacto mental me protege.
Me mantém no jogo sem entrar em ciclos de culpa.
Foi assim que introduzi o hábito de só tocar no celular uma hora depois de acordar.
Não foi radical. Foi intencional.
E a ciência mostra que essa primeira hora é um verdadeiro campo de batalha pela qualidade do nosso dia.
O resultado de adiar o celular, mesmo que por pouco tempo, é profundo.
Isso acontece de duas formas principais:
1- Você força seu cérebro a pular do modo criativo para o reativo
Ao acordar, seu cérebro está em um estado de ondas cerebrais (Alfa e Theta) ideal para o relaxamento, a criatividade e o planejamento. O bombardeio de notificações do celular força um salto abrupto para um estado de alerta e estresse (ondas Beta).
2- Você desregula o coquetel hormonal da manhã
A primeira hora do dia é crucial para o equilíbrio químico do corpo. Pegar o celular dispara o cortisol (o hormônio do estresse) e bagunça o sistema de dopamina (o neurotransmissor da motivação).
Ponto mais importante é que, ao pegar o celular, você sequestra o processo natural de despertar do seu cérebro e sabota a química que define seu humor e sua motivação. Me conecto mais com o momento presente.
E isso importa, porque a mente não diferencia o que é real do que é apenas ruído.
Proteger essa primeira hora é, essencialmente, escolher o seu próprio sinal em meio a tanta interação.
Insight: O paradoxo do analógico em tempos de IA
Pode parecer contraditório defender o mundo analógico numa newsletter sobre tecnologia.
Mas eu não vejo incoerência nisso — vejo necessidade.
A IA, pra mim, não veio para substituir a vida.
Ela veio para que a gente possa ter mais tempo de qualidade com quem importa.
Pra usarmos a tecnologia como ferramenta de presença — e não como um vício de dopamina barata.
Não existe fórmula de bolo.
O que eu compartilho aqui é o que tem funcionado pra mim nesse momento.
Teste, itere e descubra o que funciona pra você.
Literatura: o treino mental mais humano que existe
Hoje o insight não é sobre tecnologia.
É sobre o tipo de repertório que faz a gente usar bem qualquer tecnologia: compreender a nós mesmos.
Na juventude, mesmo já sendo leitor, eu tinha um pré-conceito achava que literatura era só ficção.
Foram professores, como o Rafael Ruiz, que me mostraram o contrário.
Eles me fizeram perceber que a literatura é uma das formas mais nobres de traduzir sentimentos e complexidades humanas.
Quando as palavras do dia a dia faltam, ela encontra símbolos.
Meu livro preferido da adolescência foi O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger.

Naquele momento de sentimentos novos e responsabilidades chegando, os diálogos profundos do personagem Holden Caulfield sobre as hipocrisias do mundo adulto me faziam sentir, de alguma forma, compreendido.
Choveu na porcaria do túmulo dele, e choveu na grama em cima da barriga dele. Chovia por todo lado. O pessoal todo que estava de visita saiu correndo para os carros. Foi isso que me deixou doido. Todo mundo podia correr para dentro dos carros, ligar o rádio e tudo e ir jantar em algum lugar bacana - todo mundo menos o Allie.
Literatura é isso.
E o mais incrível é que, dependendo da fase da vida, a mesma história revela uma coisa completamente nova.
Essa percepção de que a mesma história muda se aplica perfeitamente à minha relação com outros autores.
Posso dizer que meu terapeuta dos últimos tempos tem sido Fiódor Dostoiévski.
Ler seus livros nos últimos anos e perceber que ele descreveu a mente humana com uma precisão desconcertante em pleno século XIX.
É uma experiência única que amplia muito o seu repertório.
É aí que a literatura toca: nos mostra o que, no fundo, já sabemos, mas não queríamos admitir ou não tínhamos capacidade de processar.
De fato, não existe nada mais deplorável do que, por exemplo, ser rico, de boa família, de boa aparência, de instrução regular, não tolo, até bom, e ao mesmo tempo não ter nenhum talento, nenhuma peculiaridade, inclusive nenhuma esquisitice, nenhuma idéia própria, ser terminantemente como todo mundo.

Ela consegue isso a partir das histórias.
Para quem quer começar (ou recomeçar) nesse mundo, indico um clássico que passa mensagens lindas e que precisam ser revisitadas de tempos em tempos:
O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry.
Sempre atual, sempre tocante.
Simples e, por isso mesmo, extremamente profundo.
Tu não és para mim senão uma pessoa inteiramente igual a cem mil outras pessoas. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás pra mim o único no mundo. E eu serei para ti a única no mundo.

A frente fria chegou à Tríplice Fronteira — e com ela, o silêncio bom da introspecção
Empreender é como navegar sem GPS.
Essa semana, depois de várias mini vitórias — automações que funcionaram, projetos que ganharam corpo, eventos que estão saindo do papel — me vi mais introspectivo.
E como em toda travessia, surgiram barreiras mentais.
Procurei um amigo. Falei tudo em voz alta. E só de falar, a clareza começou a voltar.
Quando o propósito não está claro, qualquer ferramenta vira distração.
A gente não controla o vento, mas pode ajustar as velas.
Quando algo trava, volto pro pacto inicial:
Qual é o meu mínimo viável hoje?
Onde quero chegar com isso?
Que essa edição te ajude a fazer o mesmo.
Nos encontramos na próxima travessia.
— Denys Alex
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